As regras do CRM para a publicidade médica. É possível fazer publicidade com tantas restrições?
Para tratar do assunto em questão, relacionado ao CRM, é preciso, primeiramente, estabelecer o que, de forma geral, significa publicidade. Há dois significados reconhecidos, que, por ironia, levam a abordagens completamente diferentes.
Publicidade, do ponto de vista da abordagem semiótica, vem do latim “publicus”, que significa aquilo que é público. Dessa forma, o termo “publicidade” pode ser abordado como aquilo que é público, conhecido.
Juridicamente, por exemplo, a palavra publicidade é usada nesse sentido. “Dar publicidade” a uma sentença é torná-la de conhecimento público, por meio do uso dos meios previstos e disponíveis.
Quando se faz divulgação de uma ideia nova, de uma descoberta científica, aquele que divulga está dando publicidade a essa ideia. Ele está tornando aquela informação algo de conhecimento público. É diferente de propaganda, que é um esforço contínuo de divulgação de um produto ou uma ideia, no sentido de obter convencimento.
Pode parecer complicado, mas não ainda o suficiente. É fundamental o entendimento dos conceitos para que se possa lançar um olhar sobre as disposições regulatórias do CRM.
Prosseguindo, muita gente confunde propaganda com publicidade. São conceitos que caminham lado a lado, muitas vezes tendo como finalidade atingir o mesmo objetivo, mas são diferentes.
A propaganda, como já foi dito, é a repetição de uma ideia ou de uma mensagem no sentido de obter o convencimento. A publicidade, enquanto conjunto de técnicas de comunicação, também é uma forma de convencimento. Pode-se dizer que publicidade é uma ferramenta eficaz do esforço de propaganda. É uma afirmação correta.
Por exemplo: quando uma empresa quer fazer com que o público consumidor adquira o hábito de comprar um determinado produto, ela faz propaganda ostensiva, no sentido de fazer com que as pessoas gravem aquele produto em suas mentes e lembrem dele na hora da compra.
A publicidade é o conjunto das técnicas que farão com que as pessoas vejam o produto da forma como a empresa quer que ele seja percebido por elas. Trata-se de uma coisa chamada “posicionamento”, um elemento de marketing, que é uma ciência que trata das relações de consumo, a partir da conciliação das aspirações do consumidor e das perspectivas de lucro da empresa.
Em outras palavras, ao falar de publicidade, pode-se estar falando de duas coisas completamente diferentes. Existe a publicidade no sentido de tornar público, que está ligado mais ao direito do cidadão à informação, e a publicidade como parte de um esforço de marketing no sentido de, por meio do convencimento, posicionar um produto na mente do consumidor e, com isso, torná-lo lucrativo para a empresa.
A compreensão e a abordagem do CRM
Toda essa introdução tem por objetivo esclarecer o que está em questão no tratamento dado, por exemplo, pelo Código de Ética Médica do CREMERJ (Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro), quando fala de publicidade médica.
O tempo todo, o código do CRM trata o tema a partir da abordagem da forma como o conhecimento será levado à sociedade, bem como a responsabilidade e o papel do médico nesse processo. O CRM em momento algum trata a publicidade do ponto de vista de sua natureza mercadológica, comercial, econômica e de marketing, como parte de um processo de rentabilização, lançamento, viabilidade e crescimento de um negócio.
A preocupação do CRM está mais ligada a impor limites e padrões éticos aos profissionais de medicina em sua relação com o público e com a opinião pública. É de se reparar que não aparece a palavra consumidor, inseparável do processo publicitário.
O que diz o CRM
Isso não quer dizer, em hipótese alguma, que aquilo que está previsto no Código de Ética do CRM não tem validade, muito pelo contrário. Dentro da perspectiva de zelar pela boa reputação da classe médica e pela integridade das relações-públicas, as regras estabelecidas cumprem seu papel.
O que está em questão é que, do ponto de vista da publicidade do “produto” médico, há pouca orientação.
O artigo 112, por exemplo, é magnífico ao ressaltar que o médico não pode, de maneira alguma, divulgar qualquer informação sobre assuntos médicos de maneira promocional, sensacionalista ou que tenha conteúdo inverídico. Trata-se, claramente, de uma preocupação do CRM com o papel social da medicina e com a imposição de uma conduta ética aos profissionais.
Outros artigos vedam práticas como permitir que a participação de um médico em um programa de televisão tenha outro caráter que não seja o “esclarecimento” e a “educação”, ou a divulgação fora do meio científico de descobertas médicas ou métodos de tratamento não reconhecidos oficialmente por órgão competente.
Não quer dizer que a abrangência das regras estabelecidas pelo CRM não tangencie os parâmetros da boa prática publicitária e de propaganda. O artigo 113 do código, por exemplo, veda ao médico divulgar títulos científicos que não possa comprovar e especialização em áreas em que não esteja qualificado e registrado no CRM. Trata-se, em outras palavras, de um veto à propaganda enganosa.
O artigo 117 tem o mesmo enquadramento, ao vetar a apresentação de material médico como original sem que isso seja verdade.
Porém, a preocupação maior é evitar que o médico use sua imagem e sua função social de forma comercial, visando obter dividendos de qualquer natureza, o que, para o bem da classe, não veda a publicidade como forma de ajudar na alavancagem do negócio (sim, a atividade médica pode ser um negócio e isso não a denigre em nada, a partir do momento em que um serviço é prestado em troca de pagamento) médico, seja ele um consultório, um laboratório ou uma clínica.
A publicidade de fato
Ainda que a abordagem seja híbrida, tratando da publicidade em si e, ao mesmo tempo, de estabelecer limites éticos para a atuação pública do profissional de saúde, o Manual de Publicidade Médica, Resolução número 1.974/11, do CFM, estabelece, em seu anexo 1, algumas regras claras que devem ser observadas na prática da publicidade de fato.
Com o título “Critérios gerais de publicidade e propaganda”, o anexo estabelece várias regras que se aplicam e limitam a prática publicitária para produtos ligados a serviços médicos.
A primeira delas é que, na peça publicitária, seja impressa, de rádio, de internet ou de TV, deve aparecer com destaque a identificação do médico ou empresa de serviços médicos e responsável, constando, entre outros dados, por exemplo, o número do registro no CRM.
O mais importante, porém, está no item 6 do anexo 1, que trata das proibições gerais. Selecionamos os principais itens dentre os que mais afetam o trabalho do publicitário. De qualquer forma, quem quer que vá elaborar uma campanha deve adotae como verdadeiro manual de instruções o Manual de Publicidade Médica.
1 – É proibido o uso de expressões que exaltem uma pretensa superioridade do objeto da campanha.
2 – Sugerir ser o único capaz de realizar um tratamento ou assegurar o sucesso do mesmo.
3 – Usar a imagem de pessoas publicamente conhecidas afirmando usar os serviços médicos do especialista ou empresa médica.
4 – Sugerir diagnósticos e tratamentos de forma genérica, independente de consulta.
5 – Relacionar o tratamento à melhoria de desempenho físico, intelectual, estético ou de outra ordem.
6 – Usar imagens impactantes de transformações no corpo humano, em qualquer sentido, causadas por doenças ou pelo tratamento.
7 – Dirigir mensagens, imagens e símbolos a crianças e adolescentes, nos termos do Estatuto da Criança e do Adolescente.
8 – Dirigir mensagens que associem o médico a ganhos de autoimagem por parte do paciente.
9 – Usar demonstrações gráficas que não representem com rigor a informação expressa nos estudos científicos referidos, sobretudo induzindo o receptor da mensagem a confusão e equívocos.
10 – Divulgar preço de serviços ou formas de pagamento como diferencial competitivo.
No mais, a atividade publicitária tem sua própria regulamentação, sendo que alguns cuidados expressos nas recomendações e normas do CRM irão ao encontro das boas práticas propostas pelo mercado publicitário e, certamente, da agência de publicidade que você escolher.
Mas tem alguma coisa que não seja proibida?
É bem verdade que tantas regras assustam e causam a impressão de engessamento do processo criativo de uma campanha publicitária. É uma preocupação compreensível, já que a regulamentação do CRM e o Manual do CFM atingem em cheio alguns pontos essenciais para a propaganda do negócio. Afinal de contas, como fazer propaganda sem poder evidenciar diferenciais de produto ou serviço? Como fazer publicidade sem evidenciar um posicionamento que faça com que o consultório ou serviço médico seja visto como algo único?
Essa última pergunta leva a uma abordagem mais completa à luz do marketing. Em resumo, porém, vale lembrar que várias empresas médicas recorrem à publicidade e à propaganda. Primeiramente, nada impede que o esforço publicitário seja orientado para mostrar aquilo que você tem a oferecer, sejam os tratamentos, as parcerias, os critérios de seleção profissional, o treinamento dos profissionais envolvidos em atendimento, um conceito exclusivo na apresentação ou nos inúmeros processos médicos.
Tudo é uma questão de identificar e desenvolver diferenciais a partir do conhecimento do negócio, do dia a dia, do relacionamento com os pacientes e parentes e outros aspectos.
A conclusão é de que não há nada que um bom profissional ou uma boa consultoria de marketing não ajude a resolver. Não há nada que uma visão gerencial com orientação de negócios não resolva. É possível usar a publicidade de forma positiva e obter resultados satisfatórios.
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